sábado, 18 de abril de 2015 0 comentários

impotência potente


Veio-me de súbito uma vontade de dormir num cansaço misto em físico e mental. Deitei. E naquele estado de quase sono sem de fato ter dormindo ainda, numa meia consciência inconsciente onde você não sabe se está acordado mas o contrário também não é verdadeiro, tive uma sequência muito clara e também muito rápida de três pensamentos que foram eu ter me imaginado andando pela casa, depois eu me olhando no espelho do banheiro e depois uma força em negro apagou qualquer outra vontade de imagem de minha mente. Não sei se eu conseguiria descrever melhor o que vi mesmo que em pensamento pois pensei também ter visto algo em breve vermelho que de tão breve até agora me parece ilusão, pois tudo ganhou um preto que beirou a loucura. O que senti? Nesse exato e efêmero momento eu sistematicamente e simultaneamente, numa experiência que direi a vida inteira ter sido única pela certeza da probabilidade de não repetição, apertei meu lençol com tanta força que fiz pressão contra minha perna, arregalei os olhos como nunca havia feito antes da mesma forma que foi grande o meu espanto. Sim, agora misturando esses dois blocos de coisas escritas posso contar o que percebi quase também que ao mesmo tempo que tudo isso aconteceu, e eu não sabia se mantinha os olhos abertos pelo espanto com as sensações que eu tive ou pelo espanto que aqueles pensamentos sobre o que acabara de acontecer me provocaram, e num efeito cascata, fiquei a meditar por quase meia hora, paralisado na cama ao mesmo tempo que não acreditava do que tinha acontecido pelo absurdo que é para o alheio o que eu estava pensando. Qual era a sensação depois de toda essa performance? Ali, naquele momento onde tudo isso aconteceu ao mesmo tempo e se estendeu por mais ou menos meia hora, eu tive a certeza mais que absoluta que a minha existência nesse universo, à minha revelia, estava se desconectando desse plano para se fundir, ainda que para um breve sonho, à outra existência minha em outro universo. Para mim, e para os físicos contemporâneos que estão chegando à mesma conclusão apenas agora sobre a existência concreta desses universos e a extensibilidade do que chamamos de existência, isso foi mágico. Pude sentir, tocar, experimentar a fina membrana que separa as dimensões em universos paralelos entre si, mas sobrepostos. Foi uma experiência única e inimaginável, mesmo que com essa tentativa de fazer alguém, a que isso ler, imaginar. Poderia ter escrito mais? Talvez, mas não sei se existem palavras com tamanha potência. É estranho tentar comunicar o limbo que nos separa de nossos outros eus e de nossos outros mundos como possibilidades de existência. Tangenciei, sem querer, a potência mais bem guardada do universo. Senti-me privilegiado e agora ficou a nostalgia. Adoraria sentir isso novamente. Adoraria ver mas agora em plena consciência o exato momento em que minha essência flui entre mundos para dar corpo à manta ininterrupta da criação. E no fundo, senti-me em paz por saber que não sou louco por pensar minhas próprias agonias, ou então que sou tão louco que nenhum outro louco entenderia minha loucura.

quarta-feira, 8 de abril de 2015 0 comentários

sob(re) dois lados..



Tudo tem dois lados e equidade é balela. Ainda que um flua para o outro e esse fluir configure o curso natural das coisas, tudo tem dois lados. E como agir diante disso? É clichê a expectativa ser a mãe da decepção e eu aceito isso, porém seria igualmente clichê quando as entranhas de um ídolo se nos permitem assistir à sua mundanidade tão ordinária...? Tenho náuseas. De quem seria a culpa? Seria dos dois lados, pois não decidiriam qual o sentido do fluxo que ordenaria sua naturalidade e então nasceu o conflito, ainda que sutil. Um conflito silencioso e conflitivo consigo mesmo para que fique sempre claro a sua natureza, ambígua, habita duas faces. Gosto muito daquele exemplo sobre quando saímos nas ruas e, além de vermos e observarmos os outros, de cá, os outros, de lá, também nos veem e nos observam. Que fazer diante disso? Reconhecer esse fluxo existencial que fundamenta a disposição das naturezas no universo, suponho. Mas, e quando aquelas entranhas, outrora expostas, mancham seu pé de um sangue equivocadamente pálido? Usou seus últimos esforços mirando pés errados, ou ainda pés que não eram necessariamente aqueles que responderiam suas perguntas conflituosas porque ambíguas, que transitam entre dois lados. Mas, e quando você pensar estar num fluxo ideal de um lado a outro, sem notar que na verdade você se deixou cristalizar por um dos lados? Como agir diante disso? Numa manipulação muito mal instrumentalizada você se permite estar, e então eu, que sempre me pergunto sobre a ambiguidade gratuita de todas as coisas, fico aqui a me perguntar sobre o porquê de eu ainda estar me perguntando sobre aquilo que não deveria ser perguntado. Mas, que isso tem necessariamente a ver com os lados, ainda que esse de cá ou esse de lá? Eu diria, talvez, que isso seja o reflexo exato de tudo aquilo que não foi pensado, porque engolido no momento inoportuno. Ou talvez ainda, e de outro lado, os clichês de certa forma não devem ser de maneira alguma subestimados, ainda que assim, tão clichês. E quando de um lado eu me percebo ordinário, do outro lado eu me doo à minha superioridade, porque foi assim que eu consegui alcançar as poucas coisas que hoje possuem a mim. Sim, você recolheu suas entranhas mas suas mãos estão manchadas. Por um lado é perceptível a destreza que tens em remediar até coisas irremediáveis. Por outro lado, é tristemente notável a falta de destreza que te acomete quando precisas lidar com aquilo que necessariamente precisa de sobrenaturalidades para ser julgado. Consequentemente, qualquer tiro sairá sempre pela culatra. É igualmente triste ver uma mente fadada à potência ser conduzida pela mais bestial designação das consequências de suas escolhas próprias, mas para não perder o costume, até se tornar clichê, isso tem dois lados. De um lado, o universo te apresenta mais uma oportunidade de não se manter cristalizado na sequência de sucessos meritocrais com a qual julgam seu devir, e de outro terá ferramentas suficiente para fazer mais e futuras análises que precisarão também de iguais sobrenaturalidades, porque antes de um ou outro lado se concretizarem, certamente um descontentamento profundamente infeliz e descontente poderá habitar tudo aquilo que habitas. E como agir diante disso? Vire-se ao Norte. Junte seus dois pés, um junto ao outro, bem redundante, como se fosses os dois lados. Dê alguns passos atrás e torne a olhar para o Norte. Pois lá é onde qualquer ambiguidade encontra paz e deixa de ser assim, tão de um lado ou de outro.

 
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